Também conhecida como "a mulher sem face", ela foi descrita pela polícia como a "mulher mais perigosa da Alemanha". Investigações conectavam essa mulher a seis assassinatos, entre eles a de um aposentado que foi estrangulado, com base em traços idênticos de DNA, encontrados em 40 cenas de crimes espalhadas pelo sul da Alemanha e Áustria.
A suspeita recebeu o nome de "o fantasma de Heilbronn", em referência a uma cidade no sul da Alemanha onde ela supostamente teria matado uma policial de 22 anos, em 2007. Na época, a polícia ofereceu uma recompensa de 300 mil euros por informações que pudessem levar à sua prisão.
Em muitos aspectos, os crimes da mulher fantasma pareciam calculados. Ela era petulante, isso era claro, mas não era imprudente. Ela não deixou impressões digitais, nenhuma testemunha, nenhuma pista, exceto seu DNA. À medida que os crimes ligados a ela se multiplicavam - invasões, arrombamentos e roubos de caixas registradoras -, as cenas às vezes produziam um segundo filamento de DNA. Isso sugeria que a mulher sem rosto às vezes trabalhava com um cúmplice, mas nunca com o mesmo duas vezes. Essa inferência sugeria poderes de manipulação ou intimidação que mantinham uma série de associados calados. De muitas maneiras, seus métodos pareciam com o trabalho de um psicopata frio e ardiloso.
Alguns dos casos eram estranhamente desconcertantes. Em 2005, na cidade de Worms, um cigano local atirou em seu irmão com uma pistola calibre 7,65. Após sua prisão por tentativa de homicídio, vestígios do DNA da misteriosa mulher foram encontrados em uma das balas. O jornal “The Observer”, em 2008, sugeriu “que ela poderia ter laços com grupos e comunidades que se movem pelas fronteiras cada vez mais porosas da Europa”.
Em março de 2009, as autoridades francesas tentaram usar o DNA para identificar um cadáver queimado. A investigação deles indicou que o corpo era provavelmente o de um homem em busca de asilo que desapareceu. O pedido de asilo do homem, que ele havia preenchido anos antes, exigira uma impressão digital. As autoridades esperavam que, ao combinar o DNA do cadáver com qualquer vestígio de material genético encontrado na impressão digital, pudessem estabelecer claramente a identidade do homem morto.
Em vez disso, os resultados foram literalmente incríveis: o DNA obtido da impressão digital pertencia ao fantasma de Heilbronn, a mulher sem face.
Obviamente, isso era impossível, já que o requerente de asilo era homem, e o DNA do fantasma pertencia a uma mulher. Um segundo teste das impressões digitais não encontrou o DNA do fantasma. Parecia apenas uma explicação: a amostra retirada da impressão digital deveria estar contaminada.
Os investigadores rapidamente encontraram um padrão: o laboratório francês e o laboratório de Heilbronn usaram a mesma marca de cotonete, fabricada por uma mesma empresa alemã. Outros laboratórios que usaram uma marca diferente de cotonetes nunca haviam encontrado qualquer vestígio que apontassem para o fantasma.
Depois de quase duas décadas, a mulher finalmente recebeu um rosto. Ela era funcionária da fábrica Greiner Bio-One, uma mulher inocente, embora descuidada, que trabalhava empacotando cotonetes estéreis.
Os cotonetes foram comercializados como sendo estéreis, e eles eram, pois foram processados para remover todos os germes, fungos e vírus, mas o processo não destruiu o DNA de quem os manipulou. Por isso, técnicos forenses de três países haviam encontrado o mesmo DNA espalhado por dezenas de cenas de crimes.
Por mais embaraçoso que este caso possa ser, ele destacou algumas questões muito reais sobre o risco de contaminação da cena do crime. A introdução de um DNA estranho em uma amostra de cena do crime, seja no próprio local ou durante análises laboratoriais, pode ter efeitos devastadores em uma investigação.
No caso do fantasma de Heilbronn, a polícia passou dezesseis anos investigando, gastou aproximadamente 2 milhões de euros e milhares de horas-homem, em busca de uma 'serial killer' ligada a mais de 40 crimes na Alemanha, Áustria e França, que nunca existiu. Além do óbvio desperdício, ocorreram dezenas de crimes violentos cujos culpados foram potencialmente ignorados, pois os investigadores perseguiam um fantasma.
Então, como a comunidade científica forense pode impedir que isso aconteça novamente? Parte da resposta está em um novo padrão ISO, publicado no início de 2016, cujo objetivo é minimizar o risco de contaminação por DNA. A norma também define critérios de aprovação, ou reprovação, para que os fabricantes possam, pela primeira vez, testar seus produtos em relação aos requisitos da indústria forense, para garantir que eles sejam adequados à essa finalidade. A ISO 18385 está sendo reconhecida internacionalmente como um padrão para a comunidade de DNA forense.
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