Antes de mais nada, vamos esclarecer o que é o “Corpo de Delito”.
O corpo de delito é o conjunto de vestígios materiais produzidos pelo crime, ou seja, é a sua materialidade, é aquilo que é palpável, que se vê, se ouve ou se sente, isto é, que é perceptível pelos sentidos. São os vestígios do crime, marcas, pegadas, impressões, rastros, resíduos, resquícios e fragmentos de materiais deixados no local, sendo instrumentos ou produtos do crime.
Muitas vezes o corpo de delito é o próprio corpo da vítima. Neste caso, o exame, que pode ser feito em pessoas vivas e mortas, só pode ser realizado por médico legista e serve para esclarecer como as agressões foram feitas e o que causaram. No caso de morte, é feita a necropsia, que ajuda o legista a encontrar as lesões que levaram ao óbito. Todos os casos de morte não natural, como as causadas por acidentes, homicídio e suicídio, devem passar pelo exame necroscópico.
Outra situação, na qual a realização do exame é obrigatória, ocorre na transferência de presos. Como todo presidiário está sob responsabilidade do Estado, cada vez que ele entra, sai ou é transferido de presídio deve fazer o exame de corpo de delito, nesses casos também chamado de exame cautelar. O objetivo é atestar a integridade física do detento. O procedimento garante que o preso não sofreu violência durante o período em que esteve na cadeia. Se for comprovada alguma agressão, a vítima pode processar o Estado.
A finalidade é sempre encontrar vestígios que ajudem a provar que houve um crime material. “Na Medicina Legal, os crimes em que se realiza o exame de corpo de delito são os de lesões corporais, os de natureza sexual e os homicídios e acidentes”, diz Roberto Wagner Bezerra de Araújo, professor do Departamento de Patologia e Medicina Legal da Universidade Federal do Ceará. Suicídios também são examinados, embora não sejam crime.
Como os vestígios desaparecem com o tempo, o ideal é que a vítima procure a polícia o quanto antes. Ela deve realizar o Boletim de Ocorrência após o crime e a autoridade legal (por exemplo, o delegado de polícia) fará a solicitação oficial do exame pelo IML (o Código de Ética Médica proíbe a realização desse exame em delegacias, unidades militares e presídios).
Mas, caso isso não seja possível, “Existe o exame de corpo de delito indireto, que envolve análise de prontuários médicos e relatórios de hospitais”, explica Renato Evando Moreira Filho, também da UFC.
O médico legista, que realiza esse exame, deve possuir especialização em medicina legal e perícias médicas. O procedimento exato depende do tipo de crime ocorrido, mas a ideia é examinar o corpo e procurar vestígios, como lesões corporais. Muitas vezes, um exame visual é suficiente e não são necessários equipamentos.
A vítima é analisada minuciosamente e todas as lesões encontradas são descritas com fidelidade.
Entre as lesões identificáveis estão as marcas avermelhadas deixadas por tapas e bofetadas, por exemplo. Em casos de lesões corporais também são comuns arranhões e, em estupros, o médico busca por socos e mordidas. Se a vítima foi agredida com armas de fogo, também são verificados ferimentos de entrada e saída dos projéteis.
Ao analisar a lesão e as características de sua ação no corpo, o médico legista consegue, muitas vezes, identificar a arma ou o objeto utilizado pelo agressor. É que algumas lesões apresentam marcas muito próprias. Exemplos são ferimentos causados por fivelas de cinto, cassetetes e saltos de sapatos.
Em vítimas de estupro, faz-se um exame sexológico. O médico examina o corpo inteiro, incluindo os genitais, e constata se houve ato sexual e se há marcas de violência. São recolhidos sêmen (quando o agressor é homem), pelos, secreções, suor e vestígios de pele e sangue, inclusive sob as unhas. Para recolher restos de sêmen e pegar amostras da mucosa bucal, usa-se o swab, um cotonete de haste comprida. Se a vítima não puder ir ao IML, esse exame pode ser feito no hospital – a pedido da autoridade, o médico legista se desloca até o local.
Também podem ser recolhidas amostras. Um exame de sangue, por exemplo, revela infecções que a vítima possa ter adquirido durante a agressão. Se a vítima afirmar que foi drogada, também se coletam sangue e urina para pesquisa de álcool e drogas. Exames como ultrassom mostram se a vítima mulher estava grávida ao ser atacada ou se engravidou após o estupro.
Em mortos, são realizadas radiografias para identificar ossos quebrados e áreas de agressão. Também são removidos os projéteis de arma de fogo para identificar a arma utilizada. Outros procedimentos são realizados, dependendo do tipo de morte violenta (homicídio, suicídio ou acidente).
Depois que o exame é realizado, o legista elabora um laudo e encaminha para a autoridade que o solicitou (como delegados de polícia e juízes). Esse laudo passa a constituir os autos de um processo. O exame de corpo de delito é usado como prova num tribunal, e o médico que o realizou pode ser chamado para ser ouvido como perito do caso.
Fontes: Texto de Julia Moióli, com consultoria de Renato Evando Moreira Filho e Roberto Wagner Bezerra de Araújo, professores do Departamento de Patologia e Medicina Legal da Universidade do Ceará. Texto de Dante Grecco.
Sites: Direitonet, Jusbrasil, MSD Manuals e Conteúdo Jurídico; documento Procedimento Operacional Padrão (POP) Perícia Criminal, publicado pelo Ministério da Justiça.
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