Segundo a definição da Associação Americana de Psicologia, de 1993, “A hipnose é um procedimento durante o qual um pesquisador ou profissional da saúde, sugere que um cliente, paciente ou indivíduo, experimente mudanças nas sensações, percepções, pensamentos ou comportamento”.
O termo hipnose, do grego hipnos = sono + latim osis = ação ou processo, deve o seu nome ao médico e pesquisador britânico James Braid (1795-1860), que assim o definiu por achar que se tratava de uma espécie de sono induzido. Porém, a hipnose refere-se a um outro estado de consciência. Isso só foi esclarecido muito tempo depois de Braid, no final dos anos 90, quando os exames de tomografia computadorizada passaram a ser analisados, e as ondas cerebrais mostraram formas, frequências e padrões distintos para cada caso. Quando tal equívoco foi comprovado, o termo já estava consagrado, e permanece sendo usado no meio científico e popular até hoje.
A hipnose é um estado da mente que se instala de forma natural. Sempre que deixamos de prestar atenção aos muitos estímulos ao redor, e focamos em um único ponto, estamos hipnotizados em algum grau. O que os médicos fazem é estimular estados mais profundos e controlados, com objetivos claros. Por isso, “Não é hipnotizável quem não consegue fixar a atenção: maníacos, deprimidos graves, pessoas com atraso mental moderado ou sob o efeito de drogas psicoestimulantes”, resume o psiquiatra Fernando Portela Câmara, professor da Universidade Federal Fluminense.
Apesar dessa técnica ainda ser cercada de mitos enganosos, ela está sendo usada com fins científicos em diversas áreas, inclusive na investigação criminal.
Desde que foi fundado, em 1999, o Laboratório de Hipnose Forense do Instituto de Criminalística do Estado do Paraná resolveu mais de 800 casos utilizando a técnica de hipnose em testemunhas, e também em vítimas, para que elas se recordem de detalhes cruciais que estão gravados em seus subconscientes. São informações que podem melhorar a identificação do rosto do criminoso, a cor da roupa que ele usava, uma placa de carro, uma placa de rua ou o logotipo de uma empresa dos arredores, tudo que possa vir a ajudar na investigação.
Em um caso recente, policiais de Ponta Grossa, no interior do Paraná, estavam averiguando um atropelamento com vítimas fatais, e também com dois adolescentes que sobreviveram. Porém, ambos não tinham lembrança do que havia acontecido.
Com base em depoimentos de testemunhas, a polícia acreditava que o veículo do criminoso era um Ômega bordô, mas não havia qualquer evidência de que esse carro existia. Com a ajuda de um terapeuta, os dois adolescentes se submeteram à hipnose e, resgatando as memórias do caso, garantiram: se tratava de um Ômega azul. Com essa informação os policiais conseguiram encontrar o carro, abandonado em um barracão, e chegaram ao motorista culpado.
O relato de uma pessoa hipnotizada, sozinho, não tem valor judicial, ainda assim, muitas vezes a cor exata de um carro é o suficiente para desvendar um atropelamento, desde que os investigadores confirmem a pista.
O psiquiatra Dr. Rui Fernando Cruz Sampaio, fundador e chefe do laboratório à época, falecido em 2018, declarou: “Utilizo a hipnose somente em vítimas ou testemunhas de crimes, em casos especiais de assalto, sequestro, homicídios, estupros e acidentes de trânsito, com a condição da pessoa estar com um bloqueio de memória”. Um garoto de 22 anos, por exemplo, conseguiu encontrar sua família depois que foi sequestrado quando tinha 8 anos. Ele era conhecido como Michael porque era fã de Michael Jackson, vivia no Paraná e não fazia a menor ideia de quem era, ou de onde vinha. Hipnotizado, citou a cidade de Esplanada, na Bahia. Com base nessas informações, a polícia chegou à sua família, que havia perdido o garoto 14 anos antes.
A hipnose só pode acontecer a pedido do delegado, e com o consentimento da vítima, numa sessão liderada por um terapeuta e acompanhada pelo menor número de pessoas, de preferência apenas um especialista em retratos falados, quando necessário. No caso da vítima ser menor de idade, os responsáveis devem autorizar a prática e acompanhar o procedimento em uma sala ao lado, para não atrapalhar o seu andamento. Em geral, as sessões duram uma hora, mas em casos de crimes especialmente violentos podem chegar a três. Em Curitiba, a cidade que lidera no Brasil o uso de hipnose para ajudar nas investigações, o laboratório atende a sete casos por semana. Em quase todos, fornece algum tipo de informação crucial para a polícia.
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